Evento Administrativo/Jurídico #84

Sentença proferida nos autos da ACP 1588/08
“Passando ao exame do mérito da ação, tem-se que o Ministério Público entende ter ocorrido a venda de mais de oitenta “lotes” de 3000m2 cada, nos quais foram construídas unidades residenciais autônomas, a grande maioria delas edificada após supressão de vegetação nativa e sem qualquer licenciamento ambiental, algumas inclusive em área de preservação permanente (fl. 17), fato apurado pelo então Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais, conforme ofício encaminhado em 7 de outubro de 2008, subscrito pelo Engenheiro Agrônomo Renato Herrera de Araújo, supervisor do referido órgão (doc. fls. 17/20). No mesmo documento o supervisor do DEPRN indicou mais de duas dezenas de áreas alienadas, além dos respectivos adquirentes.
O Laudo de vistoria NSTT nº 230/08, referente ao processo SMA nº 89124/92, subscrito pelo biólogo Ricardo Bertoncello (fls. 23/136), informou que a área em questão teve averbada como reserva legal 68,8% de sua área integral (2722 ha), o que implicou em reserva legal de 1873 ha, dos quais apenas 93 ha estão fora do Parque Estadual da Serra do Mar, e o equivalente a 20,6% dos 450 ha que estão abaixo da cota 200. Na mesma ocasião, ressaltou o biólogo subscritor do laudo que apesar da as áreas danificadas estarem fora da área do Parque Estadual da Serra do Mar, se encontravam em sua zona de amortecimento (fl. 23). Na sequência, o biólogo identificou áreas numeradas de 1 a 83 (fls. 29/130), e ainda registrou a existência no momento das vistorias, realizadas em abril e maio de 2008, constatou a existência de placas no interior do imóvel oferecendo “lotes” de 3000m2 à venda, assim como narrou ter visualizado “a colocação de piquetes em extensas áreas, caracterizando o processo de parcelamento do solo em grande parte das áreas remanescentes” (fl. 135).
(…)
Também não socorre os réus o fato de a Fazenda Abras do Una se identificar como área rural, até porque a persistirem condutas ativas dos próprios réus em alienar glebas sem prévio loteamento ou desmembramento, e passivas no sentido de que terceiros assim agissem no interior da mesma área, seria apenas uma questão de tempo até que o conjunto de ilícitos fabricasse mais um aglomerado urbano ilícito e não planejado. Outrossim, como já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
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Vale observar que o módulo rural no município de São Sebastião é de 16ha, o que equivale a 160.000m2, muito superior aos lotes de 3.000m2 alienados no interior da área objeto da matrícula nº 14.680 do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de São Sebastião, área esta que, como dito, mais cedo ou mais tarde importaria na urbanização desautorizada, desordenada e ilegal da área, em total descompromisso com a legislação urbanística, mas, também, ambiental. Vale dizer neste caso específico que os especialistas – biólogo e engenheiro agrônomo – responsáveis pelos documentos 17/20 e 23/36 confirmaram a existência de desmatamento de vegetação nativa e, outrossim, na zona de amortecimento do Parque Estadual da Serra do Mar, área esta em que também impera o interesse ambiental, especialmente em razão do conhecido “efeito borda”.
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Em face do exposto, confirmo a liminar deferida às fls. 706/707, a qual torno definitiva, e julgo parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos termos do inciso I do artigo 269 do Código de Processo Civil, a fim de determinar aos réus que cessem toda e qualquer atividade de alienação de glebas, lotes ou frações do imóvel matriculado no Cartório de Registro de Imóveis  sob o número 14.680, bem como cessem e se abstenham de executar obras e construções de qualquer tipo no local, salvo aquelas cujos projetos sejam devidamente aprovados e licenciados pelas autoridades competentes, paralisando e impedindo qualquer atividade degradadora no local, tanto quanto determino o bloqueio da referida matrícula até que devidamente regularizada a área, sem prejuízo da determinação para que os réus apresentem ao Ministério Público, sob pena de busca e apreensão, a relação de adquirentes de parcelas da terra no interior do imóvel sobredito no prazo de trinta dias a contar da intimação da presente, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, cuja incidência fica limitada a um trintídio, e cujo destino, se aplicável, será a Secretaria do Meio Ambiente do Município, a qual, com o trânsito, deverá providenciar a aplicação do recurso na aquisição de materiais e equipamentos para seu Setor de Fiscalização, sem prejuízo da multa arbitrada na liminar de fl. 706, cujo destino será o Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados. Considerando o efeito erga omnes da presente decisão, nos termos do artigo 16 da Lei nº 7.347/85, e para que não se permita a inovação na área por terceiros em descumprimento ao presente decisório, é que determino às autoridades ambientais do Município de São Sebastião, bem como da CETESB, que em conjunto providenciem o mapeamento e levantamento de todas as intervenções existentes na área, providenciando inclusive levantamento aerofotogramétrico da área, documentos cujas cópias deverão ser acostadas ao presente e, outrossim, encaminhados à Polícia Ambiental, a qual, em conjunto com os Órgãos ambientais sobreditos, providenciem o controle do embargo da área, providenciando a apuração de eventual descumprimento da presente sentença, para que cobrada a responsabilidade pela desobediência na seara criminal e, aqui, seja determinada a demolição e o desfazimento dos atos praticados em descumprimento à presente. Custas pelos réus, solidariamente. Sem imposição de verba honorária advocatícia, considerando que o autor é Ministério Público. Independente do trânsito da presente, oficie-se à CETESB e ao Município de São Sebastião para ciência da presente, bem como atendimento às determinações que acima lhes foram incumbidas e, outrossim, expeça-se mandado de averbação para confirmação do bloqueio da matrícula ao Cartório de Registro de Imóveis nos termos da presente sentença. (…)”

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